terça-feira, 12 de maio de 2009

A Coréia do Norte e Bush - a crônica do século XXI

Do Blog Óleo do Diabo

"Você não pode chamar alguém com quem quer negociar de 'eixo do mal'. Imagine que você brigou com sua mulher, que quer reatar ou até mesmo se divorciar, mas em termos amistosos. Mas aí, no começo da conversa, você a chama de 'prostituta'. Os EUA fizeram isso com a Coreia do Norte, então queimaram toda possibilidade de diálogo."

Por João Villaverde

A análise acima é de Paik Hak-soon, cientista político da Coreia do Sul, entrevistado pelo repórter Raul Juste Lores, da Folha.

George W. Bush, quando candidato pelo partido Republicano nas eleições de 2000, já mostrava - ao dizer o que pensava sobre diversas questões - ser altamente conservador. Seu conservadorismo, exemplificado dia a dia durante seus 8 anos de governo, era rancoroso e rançoso. Especialmente a partir do 11 de setembro de 2001, quando Bush ganhou o mote que elevou sua popularidade às alturas, o governo americano instituiu um "novo" modelo.

Passara a usar todo o poder hegemônico - a teoria de conquistar corações e mentes - lapidado ao longo do governo Clinton (muito ajudado, bom que se lembre, pela decadência formal do contraponto ideológico simbolizado pelos soviéticos) como agulha, ou bala, para exercer seu poder de dominação. O que Bush e seus lacaios - a turma que o aparelhava no governo - queriam (e em boa parte fizeram) era forçar o mundo a engolir a supremacia americana.

A supremacia militar, a supremacia ideológica, a supremacia cultural, a supremacia do dólar (econômica e financeira).

Em termos de política externa, Clinton praticara uma política de inteligência de não agressão e persuasão. Tinha o momento histórico ao seu lado, bem como sua posição de negociação. Exercia todo a supremacia dos Estados Unidos de uma forma igualmente unilateral, mas fazia parecer consensual. Havia consenso, mas era um consenso conquistado pela diplomacia e validado pela ideologia. Era hegemônico no sentido stricto senso, ou, melhor dizendo, gramsciano.

Bush jogou tudo isso no lixo.

Estrategicamente falando, foi ruim inclusive para os americanos. Eles perceberam isso no ano passado, quando a disputa pelo cargo de presidente foi evidenciada por dois críticos de Bush. Não apenas o candidato democrata - rival político direto - mas também John McCain, a opção republicana, pertencia a ala mais moderna do partido (mesmo McCain sendo o candidato com idade mais avançada a ter disputado uma eleição).

O moderno, compreendido com um atraso indesculpável pela sociedade americana, é entender as diferenças - todas elas - e prezar pelo poder interminável das negociações.

O governo George W. Bush não era, sob nenhum ponto de vista, moderno.

Ao optar pela guerra, por ignorar a existência dos outros, exemplificada pelo desleixo e mal trato para com a Organização das Nações Unidas (ONU) em 2003 e 2004, e pelo apoio a grupos políticos em outras nações, exemplificados pela direitização israelense vivida no período e o malfadado golpe de Estado ocorrido na Venezuela em 2002, o governo Bush sacramentou as mentes e corações neste início de século XXI.

Bush demonizou Chávez, o Irã, a Coreia do Norte, e os "terroristas" do Hizbollah e do Hamas. (Re)criou-se o maniqueísmo do "conosco ou contra nós". Dos bonzinhos (americanos e seus parceiros) contra os bandidos (os demonizados citados acima).

Hoje a irracionalidade belicista parece irrefreável no Oriente Médio, na Europa Oriental e na Coreia do Norte. E não existem sinais de que isso seja bom para ninguém, como dizia o slogan martelado pelos americanos nos últimos oito anos.

O maior abacaxi que a nova administração dos Estados Unidos herdou não é a crise - que pode ser debitada igualmente na conta de ambas ideologias partidárias dominantes, uma vez que boa parte das medidas de liberalização financeira foram feitas sob os democratas nos anos 90. O verdadeiro abacaxi herdado é o desrespeito ao resto do mundo.

O governo Obama terá de lembrar a todos que do seu país também nascem negociadores, não apenas cowboys.

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